Måneskin e o rock italiano que surpreendeu o mundo

A 65ª edição da competição Eurovision Song Contest, no último dia 22 de maio, consagrou a banda italiana Måneskin como sua grande vencedora, sendo o primeiro troféu da Itália em 31 anos. Com um desempenho formidável e uma alta pontuação, o grupo cativou uma parcela considerável da plateia, responsável por levá-lo à final, e não obstante, os jurados, deste modo chegando aos holofotes e tomando o mundo de surpresa. Naquela noite, Måneskin não somente trouxe o rock italiano de volta à um dos maiores palcos da indústria da música da Europa, como consolidou o gênero mundialmente, exclamando, na voz do vocalista: “o rock ‘n’ roll nunca morre”.

No entanto, esta não é sua vez inaugural em um posto de destaque, e tampouco a única disputa na – já relativamente desenvolvida – bagagem da promissora banda. Das ruas de Roma à vitória no Eurovision, o caminho percorrido foi permeado por sucesso comercial e uma notável recepção por parte do público, que o acolheu desde o lançamento de sua canção autoral de estreia. Indiscutivelmente, a arrebatadora presença de palco, a inesquecível estética setentista e os sons marcantes são um conjunto de fatores que vêm auxiliando Måneskin a obter cada vez mais renome e relevância em um mercado dominado pelo pop.

Com o enorme desafio de ser um ato musical tão novo e carregar a responsabilidade de ajudar a manter o rock vivo, Måneskin atrai legiões de admiradores a cada dia que passa. Atualmente, mira novos horizontes para permanecer se expressando por intermédio da arte da música e, assim, exercendo sua verdadeira paixão. Tamanha notoriedade não poderia passar despercebida para quem acompanha o cenário ou por nós do Tá No Jukebox. Abaixo, te introduzimos à este fenômeno do glam rock, além de trazer uma breve explicação de como funciona o Eurovision (que postamos previamente no nosso Twitter), para você também se tornar fã:

Da esquerda para a direita: Ethan Torchio, Victoria De Angelis, Damiano David e Thomas Raggi. Foto: Reprodução.
O   I N Í C I O   D A   C A R R E I R A   E    A   A S C E N Ç Ã O

Surgindo no circuito musical europeu em meados de 2016, o quarteto originário de Roma, na Itália, é formado por Damiano David (vocais), Victoria de Angelis (baixo), Ethan Torchio (bateria) e Thomas Raggi (guitarra), todos com idades entre 20 e 22 anos. Victoria e Thomas se conheceram ao estudarem juntos no mesmo colégio, porém, embora fossem cientes de seus interesses em comum, resolveram arriscar-se como musicistas somente em agosto de 2015. Posteriormente, se juntaram ao cantor Damiano e ao baterista Ethan – o último foi recrutado por meio de um anúncio no Facebook. Impulsionados pelo sonho de produzir rock ‘n’ roll, que adquiriram através de suas inspirações como Led Zeppelin, The Rolling Stones e The Doors, decidiram inscrever-se no PULSE Contest, um concurso de música local para artistas emergentes. Contudo, àquela altura, não possuíam um nome definido para a banda, optando por realizar um brainstorming em busca de ideias, por meio do qual Vic De Angelis, que possui ascendência dinamarquesa, pronunciou algumas palavras na língua. Por fim, måneskin, que significa luar, pareceu a opção certeira, apesar de seu emprego não estar diretamente ligado à proposta do grupo.

Logo, por meio do PULSE Contest, haveria uma mudança expressiva em sua trajetória, pois se viram diante do compromisso de começar a compor canções autorais. Como consequência de sua participação na competição, Måneskin futuramente esteve no evento local FELT MUSIC Club & School, que lhes rendeu o seu primeiro prêmio. A partir dali, passaram a se apresentar como artistas de rua pelo centro histórico de Roma. Um de seus shows inaugurais fora de sua cidade natal aconteceu em Faenza, no Meeting of Independent Record Labels de 2016, onde cerca de 30 pessoas compareceram. Foi depois de uma breve viagem à Dinamarca para alguns concertos que Måneskin fortaleceu seus objetivos profissionais e artísticos e, determinada a conquistar visibilidade nacional e internacionalmente, iniciou ensaios por numerosas horas ao dia para a produção de canções e um potencial debute com um álbum.

Ampliando suas identidades visual e sonora, indo do pop rock italiano moderno com fortes sobreposições de funk, reggae e ska ao glam rock, Måneskin abrange uma vasta gama de elementos em suas melodias e já foi classificada como, além dos gêneros citados, rock alternativo, hard rock e heavy metal. Seu estilo musical evoluiu e se modificou gradativamente conforme adicionaram inovações e arriscaram tonalidades distintas para moldarem um som que fosse único, interessante e singular, e correspondesse ao seu próprio progresso.

Måneskin tocando sua música de estreia, Chosen, no palco do X Factor italiano.

Passados dois anos de sua formação, o público geral teve contato com Måneskin quando, em 2017, participou da 11ª temporada da edição italiana do conceituado show de talentos X Factor sob a orientação do mentor Manuel Agnelli, com covers de Take Me Out, da Franz Ferdinand, Somebody Told Me, da The Killers, e Kiss This, da The Struts, entre outros, e terminou em segundo lugar. No decorrer deste, tocaram Chosen, música que foi lançada em 24 de novembro de 2017 sob o selo da Sony Music e alcançou a 2ª posição na parada italiana, a FIMI Singles Chart. Em dezembro, lançaram o EP de mesmo nome, cujo recebeu dois discos de platina da Federazione Industria Musicale Italiana e contém majoritariamente covers executados durante os shows ao vivo do X Factor.

Apesar de terem investido em músicas na língua inglesa para adentrarem na indústria, se depararam com o aparecimento da fama em 23 de março de 2018 ao divulgarem seu single em italiano Morirò da re, que perpetuou o êxito com o qual foram recebidos e que os vinha acompanhando devido ao X Factor. Em seguida, na data de 26 de outubro de 2018, lançaram seu trabalho de estúdio introdutório, intitulado Il ballo della vita. Cinco das doze faixas nas quais o timbre rouco do vocalista se mistura com uma sonoridade heterogênea são em inglês e, de acordo com declarações dos membros, a preferência pelo título implica em uma celebração da juventude e da liberdade. Ainda conforme os mesmos, escutar Led ZeppelinArctic MonkeysHarry Styles, Red Hot Chili PeppersBruno Mars os auxiliou a delinear as composições. No centro da narrativa, protagonista de hits como Torna a casa, Morirò da re e Le parole lontane, está a figura de Marlena, uma musa fictícia que representa a beleza e a mensagem da liberdade de escolha, atitude, criatividade e ousadia que os quatro músicos desejam mostrar. Foi precedido pela balada Torna a casa e ambos lideraram as paradas na Itália. Para promover o álbum, a banda criou, paralelamente, um documentário contando a sua história, chamado This Is Måneskin, que estreou nos cinemas italianos.

P A V I M E N T A N D O   O   C A M I N H O   P A R A   O   E U R O V I S I O N

Il ballo della vita foi difundido por sua primeira turnê no continente europeu, que efetuou-se em 2018 e 2019, vendendo um número superior à 140.000 ingressos e esgotando onze datas em diversos países como Espanha, França, Suíça, Alemanha, Bélgica e Reino Unido, experiência que, por fim, rendeu um documentário no Youtube do grupo. Além disso, Måneskin abriu para nomes como The Struts e Imagine Dragons. Em janeiro de 2019, lançou seu quarto single, Fear for Nobody, enquanto em abril de 2019, o seu quinto, L’altra dimensione, subiu para a quarta posição no FIMI Singles Chart. À época, o quarteto se identificava em um maior nível com seu sexto single, a confessional e reflexiva Le parole lontane, publicada em setembro de 2019, que alcançou o Top 5 da parada e foi certificada de platina. 

Måneskin sendo anunciada como a banda vencedora no palco do Eurovision durante a grande final, no dia 22 de maio. Foto: Reprodução.

Do final de 2019 até a primavera de 2020, moraram em Londres, onde se dedicaram à produção de materiais inéditos. Em outubro de 2020, revelaram a música Vent’anni. Antes de Sanremo, Måneskin anunciou um novo projeto de gravação contínuo, Teatro d’ira. O Vol. I, portanto, é seu mais recente álbum e foi gravado tanto ao vivo quanto em um estúdio rural isolado, como fizeram incontáveis figuras do rock antes deles. Ao contrário de seu antecessor, que transcorreu ao redor da musa Marlena, Teatro d’ira: Vol. I foi inspirado pelos pensamentos pessoais dos musicistas e solidificou sua reputação como artistas de música ao vivo, adicionando um toque de ambição autoral e proporcionando a variação para o hard rock com naturalidade. As letras tratam de múltiplos tópicos relacionados à geração jovem, com Vent’anni e Zitti e buoni sendo manifestos sociais sobre individualidade e trivialidades humanas, ao ponto em que I Wanna Be Your Slave e For Your Love dissertam a respeito da dualidade e devoção sob uma perspectiva romântica, e La paura del buio, acerca de indivíduos que temem o desconhecido e os outros por serem diferentes destes.

Em março de 2021, superaram-se no Festival de Música de Sanremo com a música Zitti e buoni, levando para casa o cobiçado leão de ouro, e foram automaticamente designados como o representante italiano no tradicional Eurovision Song Contest, que realizou-se em um auditório de Roterdã, na Holanda, para uma plateia de 3.500 pessoas, subsequentemente à edição de 2020 ter sido cancelada por conta da pandemia da Covid-19. O Eurovision consiste em um festival competitivo de música com um longo histórico de edições, fundado em 1956 e sediado anualmente em um país europeu pré-determinado, com 26 nações participando e enviando representantes que vão de atos solo à bandas e supergrupos, os quais são escolhidos com uma seleção interna de canções originais. É uma interessante, diversificada e extremamente elaborada festa que engloba vários gêneros, com duas semifinais e uma final, que decorreram entre os dias 18 e 22 de maio. Seu vencedor é decidido em uma votação na qual cada país cede dois conjuntos de 1 a 8 e de 10 e 12 pontos, um dado por um júri de cinco profissionais da indústria da música, e o outro, por telespectadores em casa, com a regra de não poder votar no próprio país.

Sobressaindo-se como a principal favorita, Måneskin confirmou as previsões ao vencer a disputa com uma carismática e emblemática performance, tendo recebido um total de 524 pontos e garantindo à Itália seu terceiro triunfo no Eurovision, após Gigliola Cinquetti em 1964 e Toto Cutugno em 1990. Independentemente de o Eurovision não deter a mesma ressonância hoje em dia em comparação às gerações anteriores, Måneskin provou, com o feito incomum de ser premiada por uma música cantada em sua língua nativa ao invés do inglês, que de fato o rock encontra-se vivo e seguro em suas mãos, depois de 15 edições sem um troféu para o gênero.

Måneskin reunida nos bastidores do Eurovision. Foto: Reprodução.

O     F U T U R O   A P Ó S   A   V I T Ó R I A

Måneskin está entre os artistas de maior sucesso da Itália nos últimos tempos. Em menos de quatro anos, ultrapassou a marca de um milhão de cópias vendidas entre álbuns e singles, e coletou dezessete discos de platina e seis discos de ouro na Itália. Com o triunfo no Eurovision, o álbum Teatro d’ira: vol. I, Zitti e buoni, e outras músicas entraram no top 10 nas paradas da Europa e pelo mundo, incluindo paradas globais do Spotify, e quebraram inúmeros recordes. Zitti e buoni é a primeira música italiana em 30 anos a entrar no top 20 do UK Singles Chart, e com I Wanna Be Your Slave, eles possuem duas músicas entre as 40 principais do Reino Unido. Atualmente, têm dois álbuns número um, um single número um, Torna a casa, e três singles número dois, Chosen, Morirò da re e Zitti e buoni.

A banda anunciou um novo álbum para o final deste ano, quatro shows divididos entre o Palazzetto dello Sport e o Mediolanum Forum em dezembro de 2021, e as primeiras datas de uma turnê italiana, começando em março de 2022 na Unipol Arena e terminando em abril na Arena de Verona, que já vendeu mais de 100.000 ingressos. Não obstante, estão programados para se apresentarem no Rock am Ring e no Rock im Park em junho de 2022.

Na afirmação do vocalista, Damiano David, eles são uma tradução da música do passado para a modernidade, algo que é altamente palpável em toda a sua estética oriunda das décadas de 70 e 80 e o revivalismo de um inconfundível hard rock cujo remete à velhos conhecidos do público, evocando a atmosfera proporcionada por Mötley Crue, Def Leppard e Thin Lizzy, em que a presença das linhas de baixo era acentuada, mesclando-se perfeitamente com as notas de guitarra distorcidas, batidas intensas de bateria e vocais agudos e poderosos.

Vídeo oficial da Måneskin para o grande hit Zitti e Buoni.


Mas o que causa uma identificação quase imediata é justamente a pitada de nostalgia da virada do milênio que ressoa em sua arte. Adotando atitudes verdadeiramente dignas de rockstars, os músicos evidenciam que a vocação para o rock aparenta ser de nascença e que comandam o palco e entretêm os espectadores majestosamente.

Considerada símbolo de uma nova geração que vem abraçando a tolerância e celebrando a diversidade, Måneskin traz à tona a coragem de ser você mesmo enquanto se mantém vocal no tocante aos dilemas enfrentados pela sociedade atual, partindo de uma perspectiva levemente hedonista, contemplativa quanto à vida e rebelde para nos relembrar das singularidades de nossas existências e da vivacidade dos nossos sentimentos. Definitivamente uma das faces representantes da nova década no mercado musical, é o grupo que precisávamos para respirar aliviados com a certeza de que, sim, o rock ‘n’ roll nunca morre.

Ouça a playlist This Is Måneskin no Spotify:

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